sábado, 15 de março de 2008

Entrevista de Camila Mota para O Globo

Oi Camila, é o seguinte:

Vamos dar uma matéria grande sobre os 50 anos do Oficina.
Como o ano passado entrevistamos o Zé duas vezes, queremos
dar um foco diferente e ouvir pessoas que fazem parte desta
história.

Zé é genial., todos sabem, o nome Oficina está muito ligado
a ele, mas o próprio afirma com convicção que o Oficina é
fruto da arte coletiva. E em nome desta coletividade, vamos lá :

1)Desde que ano está no Oficina?
E quais as suas funções dentro grupo?

– Estou desde 1997, sou atriz, assistente de direção, já dei
aula pras crianças e adolescentes do Movimento Bixigão
(trabalho do Teatro Oficina com os artistas do bairro, de
onde saíram as crianças do elenco mirim dos Sertões), e mais
as funções que o teatro exigir.

2)Como não recebi os releases e fichas técnicas dos
espetáculos do Jubileu, não sei se está em algum deles. Se
estiver, qual?

- O grande espetáculo do cinquentenário
é a criação desse ano.

Ficamos 5 anos fazendo Os Sertões,
um embrião de assentamento de arte:
o cultivo da terra do Oficina em São Paulo
– e das terras que passamos,
por muitas pequenas cias ligadas.
O grande elenco dos Sertões,
além de A Terra, O Homem 1 e 2,
A Luta 1 e 2,
criou bandas, shows, discos, filmes, espetáculos, amores,
comidas, fotos…
Uma Uzyna de artistas.
Nossas Presentações em Canudos ultrapassaram os limites da
comunicação com o público e injetaram o desejo incessante de
doses maiores de ligação.
Desejo de fazer do teatro uma area livre, pra serestarmos.
Os Bandidos, de Schiller,
peça parida nos ventos da tempestade do ardor irresístivel
põe em cena a contracenação entre os bandos, as bandas
e as corporações.
Muitos tipos de bandos – os criminalizados, os não
criminalizados, os de música, de teatro, de cinema,
de catar papelão,
todos que querem viver plugados;
e também várias corporações: as financeiras,
de comunicação, de entretenimento, de internet,
dos donos de aterro de lixo…
Vamos encarnar nessa peça essas personagens
e pra não encarnarmos o cliché desses protagonistas,
vamos ter de experimentar concretamente essa contracenação.
Queremos abrir pra todos os públicos:
pro que pode pagar 5 ou 1 real
e pro que paga 100 no teatro da vizinhança,
a poucos quarteirões
e que nunca veio pagar os 30 que eram cobrados nos Sertões.
São bem-vindos nesse espaço,
são protagonistas como os vizinhos que podem pagar 5 ou 1
e que também não vem.
E transformar esse tabu em totem.
Essa utopia não vai ser criada na marra,
é gostosa essa contracenação.
Não é abrir um ringue de box entre opressores e oprimidos.
Cultuar a esperteza artística.

Nos Sertões massacramos um massacre. Desmassacramos.

Vamos contracenar mais,
trazendo o público pra dançar na pista
ou deixando ele numa poltrona confortável.
Como criar uma situação para que o público do teatro não
dependa da distribuição de renda pra existir?

Esse ano temos que inventar esse espaço.
E não vamos inventar sozinhos
porque vai ser impossível ser feliz.
Vamos virar banquete pra comer e ser comido.

Estamos em cartaz com Vento Forte Para um Papagaio Subir,
vamos fazer Taniko, nô japonês que fizemos pra celebrar os
10 anos da Ethernidade do Luíz Antônio em 23 de dezembro de
1997
e vai ser recriado
pra comemoração dos 100 anos Imigração Japonesa no Brasil,
o Tokyogaqui que vai acontecer no Sesc Paulista.
Cypriano & Chan-ta-lan, escrita pelo Luíz e pela Analú
Prestes; lançar os DVDs dos Sertões
e os de Boca de Ouro, Cacilda!, Bacantes e Ham-let,
dvds patrocinados pela Petrobrás;
abrir o teatro pra música
e no fim do ano fazer um grande show com músicas do
repertório desses 50 anos
Bandidos,
a peça pra inspirarmos em todos os atos,
também bancada com energia Petrobrás
e a exposição dos 50 anos do Oficina
que queremos que seja no Sesc 24 de maio,
onde era a Mesbla, o Mappin,
mas está com uma grande parte do prédio ainda interditada.
Uma exposição sensorial pras pessoas viverem esses 50 anos,
todas as fases: a encubadeira, os pequenos burgueses,
a antropofagia, o desbunde, a repressão,
o rock'n'roll, o forró, a uzyna…
No centro de São Paulo recriarmos esse percurso.

Vou atuar nos Bandidos, Taniko, Cypriano, estou na
bilheteria de Vento Forte, quero cantar no show,
mas a minha protagonização
e a de cada atuador do Teatro Oficina Uzyna Uzona
vai ser ligando tudo!

3) O que este trabalho (período com o Oficia) trouxe para a
sua carreira e vida pessoal?

- Liberdade.

4) Quando se fala em grupo Oficina, automaticamente a
marioria das pessoas remetem a Zé Celso. Isso é bom ou ruim
para quem faz parte do grupo?

- A gente não tem mais tempo
de ficar especulando se isso é bom ou ruim.
Temos que agir,
inventar uma comunicação concreta.
Furar o bloqueio com formas novas e velhas necessaries.

O Zé existe, é concreto, contracena.
Muitas vezes querem fazer dele uma instituição de alguma coisa,
do ócio, da orgia, das drogas, de Baco, do carnaval…
Ou ele é condenado a ficar isolado
como a única coisa que presta no Oficina,
com pessoas fazendo declarações estúpidas
pra fazer dele maravilhoso
e num altar,
sozinho…
Não entenderam nada…
Zé Celso é uma antena, que capta desejos do coletivo,
tem também os seus desejos,
é muito forte, tem muita energia e vontade de contracenar.
Claro que é um grande encenador, compositor
e mais uma lista enorme de coisas que posso colocar
com minha inspiração de apaixonada por essa arte que aprontamos.
Ele É um corifeu
que deseja uma cia de corifeus
que desejam fazer do público outros corifeus…
A gente tem meter os peitos.


5) Em que momento a "arte coletiva" acontece?

- Acontece nos ensaios, compondo músicas, criando obras
gráficas, bigornas douradas, flyers, entendendo os contratos
com patrocinadores, administrando o dinheiro, querendo
inventar outras divulgações…
A estréia do Vento Forte foi assim.
Estamos ainda sem o dinheiro em caixa,
mas não podemos ficar com o Teatro fechado,
fizemos um mutirão,
com os atores que não atuam na pista
atuando em outras funções.
Tudo isso pra ficarmos com o corpo coletivo ligado.


6) Como é trabalhar com Zé Celso e com um grupo tão numeroso?

- Maravilhoso.
E não porque é bom, ou ruim.
A gente vive muita coisa junto, delícias extraordinárias,
uns buracões bizzarros,
kaos,
marasmo…
Tudo.
A povoação foi aumentando e os acontecimentos junto.
E dá muita energia a ligação em muita gente pra jogar.
Se o grupo já é numeroso, com público é maior ainda.

8) O que é o Teatro Oficina pra você?

- É da hora.

9) Tem algum episódio que lhe marcou?

Muitos. É uma vida cheia de aventuras.

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